Samba Acadêmico Brasil Edição 09 ANO I Dezembro 2016 | Page 35

Tradição do Samba

reflexões

Pelo Telefone. O maxixe, ou também denominado como tango brasileiro, e que tem a autoria reivindicada por Hilária Batista de Almeida – A tia Cita, foi considerado o primeiro samba gravado. Como fato preponderante para esta eleição tinha que estar descrito no disco “SAMBA”. Em estudos e pesquisas posteriores encontram-se porem vários discos com a Tarja “SAMBA”, como por exemplo, em uma série de 1908 a 1915 da gravadora ODEON temos “A Vila Está Magoada” de Catulo da Paixão Cearense, “Moleque Vagabundo” Lourival Carvalho, “Chora, Chora Chorado” Bahiano, Janga e Grupo Paulista, entre muitos outros.

Assim pode-se comemorar 100 anos da gravação de Pelo Telefone, com registro em nome de Donga e Mauro de Almeida, como também se podia ter comemorado 100 anos para sambas anteriores a 1916 como, por exemplo, os citados acima.

O Samba desenvolvido no Rio de Janeiro assume sua origem no Samba da Bahia, e contou também com a valorização do então Presidente Getúlio Vargas e da antiga estatal Rádio Nacional no Rio de Janeiro ainda Capital Federal.

Mas para falar em samba qual é o que podemos nos referir? A Roda de Samba do Recôncavo Baiano outorgado como Obra Prima do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela UNESCO em 2005? O Samba Carioca tombado pelo IPHAN como Patrimônio Cultural do Brasil em outubro de 2007? Ou então o Samba de Bumbo ou Samba Rural Paulista cujo processo se encontra homologado no IPHAN? O Samba nasceu onde havia o batuque feito pelos negros nascidos livres e trazidos escravos para o Brasil.

O que se pode avaliar, no entanto é o quesito das salvaguardas incluídas nos referidos tombamentos proclamados, e para os que ainda se encontram em processo, e que vão garantir a perpetuação das culturas em suas devidas regiões. Ainda, a relevância histórica dos seus personagens incentivadores e praticantes da cultura em suas devidas regiões. Quando não valorizamos nossas culturas populares, perdemos a história e as lutas de nosso povo ficam jogadas ao vento. Vamos repercutir um pouco sobre o Patrimônio Cultural.

“Nos últimos anos, o conceito "patrimônio cultural" adquiriu um peso significativo no mundo ocidental. De um discurso patrimonial referido aos grandes monumentos artísticos do passado, interpretados como fatos destacados de uma civilização, se avançou para uma concepção do patrimônio entendido como o conjunto dos bens culturais, referente às identidades coletivas. Desta maneira, múltiplas paisagens, arquiteturas, tradições, gastronomias, expressões de arte, documentos e sítios arqueológicos passaram a ser reconhecidos e valorizados pelas comunidades e organismos governamentais na esfera local, estadual, nacional ou internacional.”

“Os bens materiais e imateriais, tangíveis e intangíveis que compreendem o patrimônio cultural são considerados "manifestações ou testemunho significativo da cultura humana", reputados como imprescindíveis para a conformação da identidade cultural de um povo.”

“Também se constatou nesse tempo um outro entendimento de história que centra seu interesse antropológico no homem e em sua existência, e assim busca contemplar todos os atores sociais e todos os campos nos quais se expressa a atividade humana. Tal compreensão implicou a valorização dos aspectos nos quais se plasma a cultura de um povo: as línguas, os instrumentos de comunicação, as relações sociais, os ritos, as cerimônias, os comportamentos coletivos, os sistemas de valores e crenças que passaram a ser vistos como referências culturais dos grupos humanos, signos que definem as culturas e que necessitavam salvaguarda.”(texto extraído do trabalho “Patrimônio cultural: a percepção da natureza como um bem não renovável” de Silvia Helena Zanirato(I); Wagner Costa Ribeiro(II), (I)Pós-doutoranda em geografia política pela USP, professora do Departamento de História — Universidade Estadual de Maringá; (II)Professor Doutor do Departamento de Geografia Política — USP)

O Processo nº69504/2013, interessado Tadeu Augusto Matheus, com data de protocolo de 13/06/2013 tem como assunto atual o Registro do Samba de Bumbo ou Samba Rural Paulista como Patrimônio Imaterial, na Categoria Universal. Temos que registrar o trabalho das pessoas do Coletivo “Culturas Populares” para o desenvolvimento deste projeto, e, ainda a inclusão do trabalho de Marcelo Manzatti “Samba Paulista, do centro cafeeiro à periferia do centro: estudo sobre o Samba de Bumbo ou Samba Rural Paulista.”

Aqui vamos repercutir somente alguns trechos deste trabalho, mas é relevante uma leitura completa deste material, pois, nos remete a acontecimentos e pessoas que fizeram parte deste contesto do Samba em São Paulo, como por exemplo, citamos este trecho em sua página (13)

“...Denominado Bambas do Samba – Sambas de Bumbo, o projeto reunia inúmeras atividades focadas no tema, como a realização de uma exposição fotográfica com os registros antológicos de Mário de Andrade e Claude Lévi-Strauss da festa de Pirapora de 1937; oficinas, onde, além de ensinar o Samba de Bumbo, foram construídos instrumentos novos que foram doados aos grupos tradicionais; apresentações de todos os grupos do gênero em atividade, além de sambistas da velha guarda do Samba Paulista como Seo Carlão do Peruche, Airton Santamaría do Camisa Verde e Branco, Hélio Bagunça e Toniquinho Batuqueiro e Osvaldinho da Cuíca, todos eles fundadores de inúmeras agremiações carnavalescas da cidade e que, também, frequentavam o Samba de Pirapora.”

Continuando com outro trecho do trabalho de Manzatti e que é parte do Processo a ser outorgado pelo IPHAN a cerca do Samba de Bumbo ou Samba Rural Paulista, agora na Conclusão:

“A Despeito dos prejuízos ou benefícios obtidos com a projeção do samba para além dos horizontes culturais das comunidades de origem, o processo metonímico que toma a parte do Rio pelo todo o Brasil, tornou míope a visão sobre a amplitude nacional do fenômeno Samba. O entendimento de sua gênese e de sua filiação aos Batuques, de ocorrência histórica antiga e de larga projeção geográfica, pode promover uma correção desse reducionismo analítico, ampliando as possibilidades de compreensão do seu papel exato dentro do universo dos nossos folguedos populares, sem prejuízo simbólico para a centralidade histórica do gênero no Rio de Janeiro.”(pag 93)

“Até a década de 1930, da mesma forma, realizava-se o Samba em todos os redutos negros da capital paulista como o Bexiga, Barra Funda, região do Lavapés/Liberdade, Brás, Mooca e Penha, além de bairros do Jabaquara e da Saúde. Algumas das personalidades ligadas ao nascimento os Cordões Carnavalescos em São Paulo frequentavam os barracões de Pirapora, e promoviam sambas do gênero em suas casas e vizinhanças, como Dionizio Barbosa, fundador do cordão e, posteriormente, Escola de Samba Camisa Verde e Branco; Geraldo Filme, liderança dos cordões Campos Elíseos e Paulistano da Glória; além de madrinha Eunice, fundadora da primeira Escola de Samba de São Paulo, a Lavapés(1937), e, Dª Sinhá, do Cordão e, posteriormente, Escola de Samba Vai Vai. Esses blocos carnavalescos, que também se apresentavam na Festa de Pirapora, desfilavam sobre a cadência da Zabumba, com as mesmas marchas sambadas características do Samba de Bumbo. Os mesmos personagens também conheceram a legendária Tiririca, forma primitiva de Capoeira ou Pernada, praticada ao som do samba, sendo os golpes desferidos em meio aos passos da dança.”(pag94)

As entidades e associações que tratam do assunto samba e dos sambistas, e seus próprios interlocutores devem estar preocupados com a manutenção de nossas culturas populares, de nossas tradições e evoluções, sob a pena de jogarmos fora todo o trabalho desenvolvido pelos nossos ancestrais e toda a cultura que está inserida nesta cultura. A preservação de nosso Patrimônio Cultural cabe a nós, somente a nós, para usufruirmos e mantermos acesa a chama da nossa Cultura Popular e nossa Identidade Cultural.

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Revista Samba Acadêmico Dexembro 2016 35 33525