Revista Redescrições | Page 68

68 impressão de que já existe, na realidade, u m modelo para este tema e que o tema apenas se lhe aproxima, lhe corresponde, se esta parte for repetida? Ou terei que proferir a inanidade: „soa ainda mais belo que a repetição‟? (Vê-se a propósito, o papel idiota que a palavra „belo‟ desempenha em estética.) Apesar de tudo, não há qualquer paradigma além do próprio tema. E contudo há, de novo, um paradig ma para além do tema: a saber, o rit mo da nossa linguagem, do nosso pensamento e do nosso sentir. E, ademais, o tema é u ma parte nova da nossa linguagem; incorpora-selhe; aprendemos um novo gesto. (WITTGENSTEIN, 2000, p. 81) Aquele que ouve a música percebe a música e não um aglomerado de regras. O mesmo acontece com aquele que recita um belo poema. Por isso a repetição é necessária, por ser um elemento que insere na música ou no poema a sua força, possibilitando que a música ou o poema se tornem um novo gesto, passível de ser comunicado e aprendido por aqueles que estão nos arredores da obra. Nesse sentido, torna-se evidente a mudança de perspectiva efetuada pelo filósofo: Se anteriormente se tinha visto que a obra de arte era de um ponto de vista cognitivo pertinente por ser um exercício perceptivo de notar um aspecto, aqui está a ser sublinhado o modo como que u ma obra de arte se incorpora na vida e, assim, se torna uma nova parte da linguagem, u ma nova expressão. E ao ser u ma nova expressão o único modo de a poder compreender e aprender é olhando para o modo como é utilizada e aplicada e aprender a partir daí. (CRESPO, 2011, p. 329) O que parece estar em evidência nessa nova perspectiva é o pragmatismo wittgensteiniano, defendido nas Investigações Filosóficas. A experiência e o valor da obra de arte não podem ser expressos por meio da linguagem e, principalmente, não estão reduzidos a um sistema de regras externas a ela. É nesse ponto que surgem as maiores dificuldades para todos aqueles que desejam explicar a experiência artística com rigor, pautando-se em critérios assentados no princípio de causalidade. O objetivo repousa no olhar que leva em consideração o contexto próprio da arte, os jogos de linguagem, as regras, as formas de vida, enfim, toda a comunidade hermenêutica da qual o sujeito que observa e comunica é parte. Comunidade que fala a mesma língua, que compreende e joga o mesmo jogo, seguindo as mesmas regras. Desse modo, fica manifesto que “a ligação entre o interesse filosófico de Wittgenstein em „notar aspectos‟ e seu interesse cultural é simples e direto” (MONK, 1995, p. 468), o que permite aproximar a atividade e a investigação filosófica com a atividade e a investigação estética: é esse o espaço que a estética ocupa na filosofia de Wittgenstein. Redescrições - Revista online do GT de Prag matis mo, ano VI, nº 1, 2015 [p. 56/69]