Revista Redescrições | Page 103

103 mundo é um conglomerado de pátios desérticos. A imagem do saco de batatas que Marx usa, em seu 18 de Brumário, para descrever a situação dos agricultores loteados na França é a primeira descrição do estado da espuma molhada. Cada célula flutua passando pelas outras, cega para o seu ambiente compartilhado, sem tocar na outra, apesar de todas as suas similaridades. Quanto da constituição psicossocial do espaço permanece na metáfora da espuma, e o que permanece da perspectiva construtivista de constituir espaço? A espuma, em minha opinião, é uma expressão muito útil para aquilo que os arquitetos chamam de densidade – ela mesma um fator negentrópico. A densidade pode ser expressa em termos psicossociais por um coeficiente de irritação mútua. Pessoas geram atmo-sfera (atmo-sphere) exercendo pressão mútua umas nas outras, empurrando umas as outras. Nós nunca devemos esquecer que aquilo que chamamos “sociedade” implica o fenômeno de vizinhos não bem-vindos. Então, densidade é também uma expressão para nosso excessivo estado comunicativo, e, incident-almente (incidentally), a ideologia de comunicação está repetid-amente (repeat-edly) nos instigando a expandi-lo ainda mais. Qualquer um que leve a densidade a sério, em contraste, finda por reconhecer o valor de paredes. Essa observação não é mais compatível com o modernismo clássico, que estabeleceu o ideal de habitação transparente, o ideal de que as relações de dentro deveriam ser refletidas nas relações de fora, e vice-versa. Hoje, estamos novamente colocando em primeiro plano um modo em que uma construção possa se isolar, embora isso não possa ser confundido com sua solidez. Visto como fenômeno independente, o isolamento é uma forma de explicação das condições de convivência com vizinhos. Alguém deveria escrever um livro reconhecendo o valor do isolamento, descrevendo uma dimensão da coexistência humana que reconheça que as pessoas também possuem uma necessidade infinita por não comunicação. Todas as características ditatoriais da modernidade se originam de uma antropologia excessivamente comuni-cativa (communi-cative): por tempo de mais, a noção dogmática de uma imagem excessivamente comunicativa do homem foi ingenuamente adotada. No que se refere à imagem da espuma, você pode mostrar que as formas pequenas nos protegem da fusão com a massa e com as correspondentes Redescrições – Revista online do GT de Pragmatismo, ano VI, nº 1, 2015 [p. 86/105]