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não possui termos intrínsecos com os quais devemos a ela nos referir, torna-se azado
sugerir uma linguagem capaz de fazê-lo, linguagem esta que é consignada pelo uso que
dela fazemos25.
Pode-se dizer, em uníssono com Putnam, que o que liga a crítica do realismo
tradicional à reformulação do conceito de fato é a limitação que as tradicionais
dicotomias “juízos de fato versus juízos de valor” e “verdades de fato versus verdades
analíticas” promovem. É justamente a tomada de posição do realismo tradicional que irá
contaminar o conceito de fato, fazendo deste um conceito que, em sua versão moderna,
somente refere-se a objetos que podem ser percebidos pelos sentidos, deixando os
valores relegados à subjetividade plena.
Segundo Putnam, estas dicotomias estanques “corromperam nosso pensamento,
tanto no raciocínio ético como na descrição do mundo, principalmente, por impedir-nos
de ver como a avaliação e a descrição estão interconectadas e são interdependentes”
(2008a, p. 15). A limitação se sobrepõe ao conteúdo filosófico e torna-se consagrada. O
esforço de Putnam em buscar um novo tipo de realismo que se preste a uma explicação
heterodoxa de como nos relacionamos com o mundo nos é importante porque ela
necessariamente reformula aspectos da metafísica tradicional, lançando-lhe as bases
para uma contestação do conceito de objetividade que se consolidou na história da
filosofia, desde a filosofia moderna26.
Passemos à análise sobre o pressuposto último do realismo tradicional criticado
por Putnam, a saber, que há “uma relação fixa de ‘correspondência’ em termos da qual
se supõe que a verdade seja definida” (2008c, p.35). Putnam nos lembra, após
mencionar o pressuposto do realismo, que sua rejeição está caracterizada pela
25
Não haver uma linguagem própria à natureza, com a qual poderíamos nos referir a ela
perfeitamente, caso conseguíssemos fazer uso de tal linguagem, não nos coloca na difícil situação na qual
não podemos nos referir com precisão à realidade: apenas teremos, para descrever e denotar as
propriedades da natureza, que fazer uso de uma terminologia que não é intrínseca à realidade, mas a qual
ela se refere e por ela é motivada efetivamente. Podemos afirmar que os termos que usamos para nos
referir à natureza lhe são extrínsecos, embora se refiram a ela, sempre com maior ou menor grau de
precisão, e por ela são motivados. Por isso, a nós, na acepção linguística, cabe “renegociar” nossos termos
de referência (PUTNAM, 2008c, p. 23).
26
A dificuldade que se tem ao tentar conectar as questões clássicas do realismo tradicional a uma
análise de sua influência nas questões de valor (ético) está posta pela falta de acuidade que temos, pois
não damos importância suficiente àquilo que as une – trata-se de uma polarização, também estanque,
entre objetividade e subjetividade. Uma tomada de posição inovadora com relação ao realismo implicará
outro ponto de vista concernente à objetividade, pois teremos que atenuar, no caso específico de Putnam,
a linha entre a objetividade e a subjetividade para darmos conta dos aspectos perceptivos com relação ao
mundo ou, em outras palavras, para conseguirmos explicar a relação entre a mente e o mundo. Está
patente que nos interessa enfatizar os tópicos que poderão nos fornecer o instrumental necessário para
seguir o argumento de Putnam, e que a linguagem exerce um papel fundamental que estará no centro da
compreensão putnamiana da verdade. Temos, neste momento, a sua crítica ao realismo tradicional.
Redescrições - Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 49 a 76]