Revista Redescrições | Page 67

67 Este exemplo levantado por somas mereológicas suscita uma modificação das concepções tradicionais acerca dos objetos e, mais ainda, da alegação de conhecimento possível que deles temos, e de que suas propriedades possíveis são passíveis de mudanças centrais. Segundo Putnam: O realista tradicional parte do princípio de que os nomes gerais correspondem, de maneira mais ou menos unívoca, a várias “propriedade” de “objetos”, em algum sentido de “propriedade” e em algum sentido de “objeto” estabelecidos de uma vez por todas, e de que as alegações de conhecimento são simplesmente alegações sobre a distribuição dessas “propriedades nesses “objetos” (PUTNAM, 2008, p.22) Putnam considera que o realista tradicional está completamente certo em um ponto: ele tem a acertada convicção de que a realidade é independente, e que as descrições que dela fazemos e chamamos de ‘mundo’ devem manter uma espécie de responsabilidade cognitiva. Em que pese essa imagem, não devemos a ela conectar a noção de que existe uma descrição ou descrições que estão postas de uma vez por todas, todas elas possíveis, e com as quais devemos nos referir, necessariamente, a essa mesma realidade. A afirmação seguinte de Putnam é que com esta imagem das descrições que a metafísica tradicional preconiza perdemos o mais importante e verdadeiro aporte do pragmatismo: “o de que a ‘descrição’ nunca é uma mera cópia e de que estamos sempre criando novas maneiras de a linguagem poder ser responsável perante a realidade” 23 (2008c, p. 22). Embora essa contribuição possa ser tomada de vários modos, tal como o próprio James 24 e Putnam o fizeram, esse diz que não estamos habilitados a concluir o mesmo que aquele, a saber, que nós criamos, em parte, o mundo. Ora, para Putnam a existência de uma realidade independente de nós é algo do qual não podemos duvidar a sério, e o simples fato de assumir isso já o coloca na categoria daqueles que aderem ao realismo. A característica agora enfatizada é a recusa da chamada ingenuidade do realismo tradicional, segundo a qual existe uma totalidade fixa de objetos e propriedades em cuja relação descobrimos as propriedade para denotar os objetos. O que motiva esta dispensa da ingenuidade do realismo tradicional é a compreensão de que nossa linguagem e seu evidente uso estão colocados desde sempre, e que não devemos transigir com a ideia de que as propriedades, expressadas pelos 23 Esse consideração é, segundo Putnam, inspirada em William James. Ver o texto O Empirismo Radical, de William James. Esse texto está relacionado na obra Pragmatismo e textos selecionados, arrolado na bibliografia desse trabalho. 24 Redescrições - Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 49 a 76]