Revista Redescrições | Page 13

13 Como conhecido, Hegel foi quem primeiro formalmente estabeleceu as fronteiras da filosofia do direito, isto é, sua abrangência ou competência. No § 2 da introdução do livro “Princípios da Filosofia do Direito”, ele já delimita os contornos do âmbito da discussão da disciplina. Primeiro, ele afirma categoricamente que: “A ciência do direito é uma parte da filosofia” (Die Rechtswissenschaft ist ein Teil der Philosophie). Um pouco antes ele ainda acentua o objeto (Gegenstand) ou temas da filosofia da ciência do direito, que são “a idéia do direito” (die Idee des Rechts) e “o conceito de direito e a sua realização” (den Begriff des Rechts und dessen Verwirklichung) (HEGEL 1995, p. 19). Seguindo esta colocação hegeliana, a filosofia do direito seria responsável por materializar as mudanças fundamentais na ciência do direito. Rorty criticaria esse modo de apreensão, posto que diretamente rejeitaria a atribuição à filosofia do direito de uma papel como teoria fundamentadora da ciência do direito. Assim, a filosofia que se preocupa com o direito, numa linguagem rortyana ampliada, só seria interessante se fosse responsável por narrativas que fariam diferença junto a justificação do que entendemos como “direito” ou que, ao fim e ao cabo, poderiam realmente mudar crenças atribuídas a tal “ciência”. Por isso, ela teria uma importância relativa, com um sentido relevante juntamente com outras narrativas literárias igualmente importantes11. Ao levarmos a sério o que Rorty expõe, e se quisermos entender como o emprego do termo “direito” se daria, é necessário partirmos de narrativas nas quais as discussões ou conversações podem realmente modificar o sentido e funções da “ciência do direito” em particular12. As redescrições, que partem da perspectiva mais 11 Contra esta posição rortyana e uma severa crítica a aproximação de Rorty à ciência e a moral, ver: LEITER, 2007, pp. 929 e ss. 12 O importante aqui é modificar a preocupação científica do direito, voltada, entre outras coisas, em alcançar explicações acuradas da realidade (representacionismo como “espelho da natureza”) e, ao lado disso, infundir na filosofia do direito aquilo que, no entender de Rorty, tanto Sellars quanto Quine holisticamente defenderam, ou seja, a noção de que a justificação filosófica não é uma questão referente à relação especial entre idéias (ou palavras) e objetos, mas à uma conversação, uma prática social (RORTY, 1980, pp. 170-171). Neste sentido, nós entendemos o conhecimento como uma questão de justificação e prática social. Se bem entendemos Rorty, neste espaço é que devemos posicionar o direito e a filosofia que se preocupa com essa temática. Redescrições – Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 7 a 48]