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em diferentes linguagens, incluindo cantar, assoviar, fazer barulho e por ai vai. Como
Ball observa:
O órgão humano representa a alma, a individualidade no seu vagar com seus
companheiros demoníacos. Os barulhos representam o plano de fundo – o
inarticulado, o desastroso, o decisivo […] Em uma maneira tipicamente
comprimida, o poema mostra o conflito da vox humana com um mundo que a
ameaça, enreda-a e a destrói, em um mundo cujo ritmo e barulho são
inelutáveis.
Mesmo assim, após mais ou menos três meses (23 de junho de 1916), Ball
escreve em seu diário que inventou “um novo gênero de poemas – nominalmente,
Lautgedichte [poesia sonora]”. Poesia sonora, descrita por Ball, pode ser interpretada
como a autodestruição do poema tradicional, com a exposição da queda e
desaparecimento da voz individual. Ball descreve o efeito da leitura pública do primeiro
poema no Cabaret Voltaire na seguinte maneira: “Então as luzes apagaram-se, como eu
havia mandando, e, banhado em suor, eu fui carregado para fora do palco como um
bispo mágico”. A leitura desse poema sonoro foi experienciada e descrita por Ball como
uma exaustiva exposição da voz humana para as forças demoníacas do barulho. Ball
vence essa batalha (tornando-se o bispo mágico), mas somente por uma exposição
radical a essas forças demoníacas; por permitir que elas reduzam sua própria voz a puro
barulho, em vazio completo. Aqui, o sujeito representa sua morte na luta contra a mídia
– e desta maneira reganha sua soberania sem pretender se tornar um vencedor, tornar-se
um sujeito senhor. Esse sujeito se torna meio da mídia – o mensageiro que transmite a
mensagem da mídia em vez de transmitir sua própria mensagem. Se torna um meio que
faz o trabalho da mídia visível, observável, fenomenologicamente acessível.
Isso mostra o motivo da teoria da mídia não ser e não pode ser simplesmente
uma ciência e o motivo de ela não poder se livrar do sujeito, no final das contas. A mídia
mostra a si mesma somente se, e na medida em que, há frustração, mudança e
desconstrução das intenções individuais em seus usuários. Se eles vão transmitir essas
intensões absoluta e adequadamente, seus trabalhos permaneceriam não observáveis,
estruturalmente escondidos. É claro, um observador externo ainda assim será capaz de
seguir o uso dessas utilidades midiáticas, como livros, quadros, televisões,
computadores e tudo mais. Mas suas observações não seriam suficientes para
desenvolver uma teoria da mídia: uma tal observação imediata externa não seria nem ao
Redescrições – Revista online do GT de Pragmatismo, ano V, nº 3, 2014 [p. 125 a 130]