Revista Municipal de Gouveia | Page 39

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INICIATIVA PRIVADA
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REVISTA MUNICIPAL | O SENHOR ALBERTO OLIVEIRA PINTO INICIOU O SEU PERCURSO DE VIDA COMO TANTOS OUTROS VILANOVENSES , FAZENDO OS CAMINHOS DA ÁFRICA . ERA ESSE O SEU SONHO ? ALBERTO OLIVEIRA PINTO | Eu tinha a ambição de continuar os estudos , tirar uma licenciatura ; mas éramos 6 irmãos à mesa e apesar de a minha família beneficiar de alguns privilégios ( o meu pai era comerciante ) viviam-se tempos difíceis por causa da II Guerra , daí que , com 17 anos , tomei a opção de rumar a África .
ESTAMOS A FALAR EM QUE ANO ? Finais dos anos 40 do século passado .
A EUROPA VIVIA OS EFEITOS DA II GUERRA MUNDIAL . Sim , foi nessa altura .
PREFERIU IR PARA ÁFRICA DO QUE CONTINUAR COM O NEGÓCIO DE SEU PAI ? Sim . O negócio do meu pai não estava nos meus planos , daí que o meu sonho era , ou continuar a estudar ou ir para o então Congo Belga ( hoje República Democrática do Congo ). Como a primeira opção era difícil de cumprir pelas circunstâncias que atrás referi , resolvi ir para o Congo , que era o destino preferido de quem emigrava , porque se dizia que ali se ganhava muito dinheiro , o que não era de todo mentira .
QUANDO TOMOU A OPÇÃO DE IR PARA ÁFRICA , TINHA CERTAMENTE UM OBJETIVO NA SUA MENTE . Ao emigrar , a minha ideia era juntar o máximo de dinheiro que pudesse e regressar ao meu país tão rápido quanto possível . Já em África , as saudades começaram a apertar . Durante muito tempo tinha alturas em que chorava porque sentia a falta da família , dos amigos e da minha terra . Comunicar era muito difícil , não havia os meios que hoje existem . Escrevia muitas cartas nas horas vagas , para também as receber … e elas vinham . Enquanto as lia sentia uma felicidade imensa e a saudade dissipava-se por momentos .
O SEU DESTINO FOI LOGO DO CONGO BELGA ? Não . O objetivo era esse mas ainda estive cerca de um ano em S . Tomé e Príncipe , onde trabalhei num estabelecimento comercial que era propriedade de um tio meu . Entre nós havia uma cumplicidade e um afeto muito grande . Entretanto os meus tios resolveram vir passar férias a Portugal e deixaram os negócios ao cuidado do genro com quem eu não me entendia , na medida que a perspetiva de negócios dele era o oposto da minha .
FOI AÍ QUE SE DEU O PONTO DE VIRAGEM ... Certo . Ajeitei os poucos haveres que tinha numa mala , embarquei no navio Angola e fui para Luanda . Nesta cidade encontrei algumas pessoas da terra que me acolheram muitíssimo bem . Fiquei em Luanda três ou quatro dias , após o que , apanhei um avião e voei para Leopoldville . Logo que cheguei , fui recebido por uns amigos que me tentaram ajudar . Porém , as coisas não eram fáceis , tinha que ter um visto de residência ou um termo de residência ou então pagar uma caução de 20 contos , o que na altura era uma fortuna . Como não consegui reunir nenhuma das condições exigidas , as autoridades locais deram-me 24 horas para abandonar o território . Fui então para Brazzaville , do outro lado do rio , mas já território francês com um visto de turista . Em Brazzaville consegui emprego numa empresa portuguesa , onde fruto do meu trabalho e honestidade consegui as boas graças do patrão e ficámos amigos .
RM SURGIU A OPORTUNIDADE DE JUNTAR DINHEIRO E REGRESSAR A PORTUGAL , MAS OS VINHOS AINDA NÃO ESTAVAM NA SUA CABEÇA ?
AP Sim , já estavam na minha cabeça na medida que eu trabalhei muito com vinhos durante o tempo que estive em Brazzaville , já que a empresa se dedicava parcialmente à importação de vinhos de toda a Europa , incluindo Portugal . Mas como o meu destino era Leopoldville , despedi-me da empresa e fui à capital do ex-Congo Belga onde consegui emprego numa empresa suíça . Porém , como não tinha visto de residência tinha que atravessar o rio Zaire todos os dias . Disseram-me que iria ficar à experiência nessa empresa durante três meses . No entanto , mês e meio depois , fui chamado ao gabinete da direção onde o diretor me comunicou que o meu lugar era ali a trabalhar , e que iria de imediato tratar do termo de responsabilidade para obter a carta de residência no Congo Belga . E assim aconteceu . Passados uns dias mudei-me de armas e bagagem para Leopoldville .
RM QUE TEMPO DECORREU ATÉ TER O SEU PRÓPRIO NEGÓCIO ?
AP Isso ainda demorou bastante tempo . Para começar a trabalhar por minha conta , ainda tive que partir muita pedra . Foi preciso muito trabalho e persistência , mas graças a Deus cheguei onde queria .
RM FINALMENTE CRIOU O SEU PRÓPRIO NEGÓCIO . QUAL FOI O RAMO ?
AP Continuava no comércio , mas transacionava tudo o que possa imaginar : eletrodomésticos , vestuário , bens alimentares , materiais de construção , perfumaria , etc . Sem falsas modéstias , posso-lhe dizer que naquela altura ganhei muito dinheiro . O dinheiro era calculado em maços 1 milhão , 2 milhões , 3 milhões , 4 milhões , 5 milhões … era uma loucura .
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RM RESUMINDO , QUANDO COMEÇOU A TRABALHAR POR CONTA PRÓPRIA COMEÇOU FI- NALMENTE A JUNTAR ALGUM DINHEIRO .
AP Quando eu comecei a trabalhar por conta própria eu já tinha uma grande experiência de vida – falava vários dialetos locais e naturalmente o francês . Confesso mesmo que em dada altura , falava e escrevia quase tão bem o francês como o português , até porque a contabilidade era feita por mim em francês . Claro que poder falar e entender bem os dialetos e a língua oficial me dava algumas vantagens e , respondendo concretamente à sua pergunta , é verdade que foi nesse período que comecei a ganhar dinheiro . Quando se deu a independência daquela antiga colónia belga , por via das incertezas em relação ao futuro , regressei a Portugal onde abri um café na cidade do Porto que designei por Café Porto . Ao fim de algum tempo percebi que esse não era o meu negócio e resolvi regressar ao Congo e retomei as minhas atividades comerciais , só que desta vez apostei mais forte e comecei a importar mercadorias da Europa , Estados Unidos , China , Japão , Angola , Taipé , Hong Kong e muitos outros países . Mas importava em quantidades astronómicas , pois fornecia mercadorias a muitos outros portugueses estabelecidos no alto e baixo Congo .