Military Review Edição Brasileira Março-Abril 2014 | Page 79

guerra cibernética em tradução livre), Richard Clarke afirma que esses conceitos são relevantes, mas frequentemente ignorados pelos formuladores de políticas. Para Clarke, a guerra cibernética se refere a “ações por um Estado-nação destinadas a penetrar nos computadores ou redes de outro país com o intuito de causar danos ou interrupções” (p. 6). No primeiro capítulo, o autor detalha “experiências” que constituem incidentes de guerra cibernética, executados, em particular, pelos russos, norte-coreanos e israelenses. Esses casos são bem conhecidos hoje em dia: o “controle” israelense sobre o sistema de defesa antiaérea da Síria em 2007; os ataques distribuídos de negação de serviço (distributed denial of service — DDOS) pela Rússia contra a Estônia em 2007 e seus ataques cibernéticos mais sofisticados contra a Geórgia em 2008; e o ataque de botnet da Coreia do Norte contra sites norte-americanos em 2009. Clarke extrai quatro máximas desses incidentes: a guerra cibernética é real; ocorre à velocidade da luz; é global; e já começou. Essas máximas constituem o cerne do livro, no qual ele apresenta mais relatos sobre “guerreiros cibernéticos” no “espaço de combate” e descreve como os Estados Unidos da América (EUA) devem preparar-se, defender-se e retaliar. Clarke dedica a maior parte do livro a reiterar essas máximas, ilustrando-as com breves exemplos. Demonstra grande preocupação com a China, a qual, argumenta ele, vem “fazendo, sistematicamente, tudo o que um país faria, caso contemplasse obter uma capacidade ofensiva cibernética e considerasse poder ser, ele próprio, um alvo para ataques desse tipo” (p. 54). A principal preocupação de Clarke é que os EUA estejam ficando para trás em relação a países como a China. “De fato, devido à sua maior dependência de sistemas controlados ciberneticamente e à sua incapacidade, até o Military Review • Março-Abril 2014 momento, para criar defesas cibernéticas nacionais, os EUA estão, atualmente, mais vulneráveis à guerra cibernética que a Rússia ou a China. Os EUA correm maior risco que Estados menores, como a Coreia do Norte” (p. 155). Considerando a gravidade do parecer de Clarke e dos exemplos de terríveis consequências de ataques cibernéticos anteriores, seu livro merece especial atenção. A definição restrita de Clarke sobre o que constitui uma guerra cibernética é problemática. A infinidade de eventos que ele descreve realmente constituem uma “guerra”? Causar danos ou interrupções engloba uma gama bastante ampla de consequências: desde a desfiguração de um site até a incapacitação de uma rede elétrica. No mundo físico, uma ação pode ser interpretada como vandalismo, enquanto outra pode ser considerada uma destruição intencional de propriedade. Caso não haja uma intenção coercitiva de alcançar um objetivo político, os diversos ataques (cibernéticos ou não) seriam considerados um ato de guerra? Nesse sentido, o livro Cyber War Will Not Take Place (“A Guerra Cibernética não Acontecerá”, em tradução livre), de Thomas Rid, é especialmente útil para esclarecer boa parte da confusão conceitual em torno do tema. Ao contrário do livro de Clarke, o de Rid é uma obra mais acadêmica. Rid, palestrante do King's College, em Londres, defende que as ações nocivas cometidas pelo ciberespaço não constituem guerra ou combate nem são especialmente violentas. “Nenhuma ofensiva cibernética causou a perda de vidas humanas. Nenhuma ofensiva cibernética chegou a ferir pessoa alguma. Nenhuma ofensiva cibernética danificou, seriamente, prédio algum” (p. 166). Tomando como base a teoria da guerra de Clausewitz, Rid afirma que “se o emprego da força na guerra é violento, instrumental e político, então não há nenhuma ofensiva cibernética que satisfaça a todos os três critérios. Mais que isso, porém, há poucos ataques cibernéticos na história que cheguem a atender a apenas um desses critérios” (p. 4, ênfase no original). Para Rid, os eventos conduzidos pelo ciberespaço, relatados por inúmeros profissionais de segurança 77