TIAGO CORTE-REAL
acenar de cabeça e viu–os subir a escada com um olhar
desconfiado. Tirou a moeda do bolso do casaco e voltou a
girá–la, desta vez em direcção ao tecto do corredor. Os dois
novos hóspedes partilhavam uma piada enquanto subiam o
lance de escadas. O primeiro, alto de perfil majestoso,
inclinava–se na direcção do ouvido atento do segundo,
provocando risadas roucas e despreocupadas próprias dos
que vivem tempos de bonança. “O sentido de humor não
fará certamente parte do arsenal dos desonestos”, pensou
Menstap, “pelo menos dos de hoje”.
Saiu. A chuva continuava a cair, mas com menos
violência do que nos últimos dias. O cinzento carregado e
impenetrável dava agora espaço a breves nuances de luz,
deixando antever que lá por cima, para além daquela
barreira de nuvens, o sol continuava a existir. Cruzou–se
com um casal de passo apressado logo no início da rua,
resguardados debaixo de um chapéu de chuva multicolor. Ele
só lhes viu a parte inferior do torso e quatro pés furiosos a
bater na calçada, perigosamente perto de onde ele se
encontrava. Sem abrandar o passo, as duas silhuetas
aceleraram em direcção ao parque de estacionamento que se
encontrava mais acima, sem sequer repararem num Menstap
espremido contra a parede. Sem descolar do reboco pintado
de creme e ainda com o peito cheio de ar, pensou que
gostaria de saber o nome daqueles dois, o seu passado, as
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