Jaime lencastre
razões nas mexidas do mister, nos treinos, porque escolhia
este ou aquele exercício, como é que os punha a defender. E
ele passava isso para dentro de campo, era como se
tivéssemos um segundo mister em campo, com o Canina a
jogar. Trocavam olhares e gestos no jogo, acho que só os
dois percebiam. O miúdo se calhar queria ser treinador, um
dia. Não o invejava, ao Hugo. Era preciso muita paciência.
Eu lá treinava os guarda-redes, isso dava-me gozo. Agora
treinar uma equipa? Não, nem pensar. Nem pensar… Mas
pronto, continuando, a mãe e o tio dele começaram a ir aos
jogos, já na segunda época. A mãe não percebia nada de
futebol e dificilmente compreendia todo aquele rebuliço à
volta do miúdo. Já o tio quase não conseguia acreditar que o
desengonçado lá de casa fazia aquilo com a bola nos pés.
Não me parecia ser muito próximo do miúdo, este tio. Ele
também não falava disso. Nunca lhe conheci o pai. Nunca
perguntei, há coisas que um gajo até se sente mal a meter-se,
não queria chatear o miúdo, eu sei lá como é que ele reagia a
isso, pá. Diziam que o tio dele nem sequer tio era, que era
um amigo da mãe que vivia com eles. Inventavam-se coisas,
já se sabe como são as pessoas. Eu por mim era deixarem
toda a gente em paz e deixarem-me em paz. Era só isso que
eu queria e, se dependesse de mim, deixavam também o
Emanuel em paz. Era assim que se chamava, Emanuel. Bom,
era a nossa época de estreia no campeonato nacional de
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