Diogo Serra
chávena de chá na mão, ouvia. Finalmente tinha-o posto a
falar, aquilo que eu, o seu narrador, mais queria.
Antes do espectáculo já ela tinha reparado no seu
vizinho. E a sua adorável sensibilidade já se tinha apercebido
da cara de fardo que ele usava todos os dias. Depois do bar,
e contra aquilo que eu esperava, ele aguardou pacientemente
à porta dela, que ela chegasse, para lhe pedir desculpa.
Falaram um pouco e combinaram encontrar-se. E daí
sucederam-se as sessões no alpendre. Em conversa ou em
música. Alguns meses depois já quem ele tinha deixado para
trás sabia de tudo, graças à voz da razão que ela conseguia
ser.
Ela também tinha o seu próprio passado, que ele
conseguia fazer desaparecer mesmo sem dar por isso. Antes
fosse o contrário. Teria algo que a distraísse daquele
sentimento que a ligava a ele, embora soubesse que ainda
havia alguém a ocupar aquele espaço. Ela sofria. Ele sentia-o,
mas nunca percebeu. Até ela não o suportar mais.
Acompanhada da guitarra, cantou para ele, com lágrimas a
escorrerem pela cara, em paralelo com a chuva que se fazia
ouvir. Como quem confessa tudo. No final, um beijo, o
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