Detectives Selvagens 0 - Julho 2014 | Page 98

ÁLVARO REIS Empunho a minha lâmina Como Quixote empunha a sua espada. E acredito… Sim, eu acredito. Acredito que desfaço o que me faz de velho E pareço novo. Mas quando aclaro o espelho, Com a minha mão molhada, E me olho nos olhos, Vejo que o que é velho, Não é o que está fora de mim, É o que está dentro de mim. Resigno-me, encolho os ombros, E busco as calças e a camisa Que a filha da minha lavadeira engomou. Salto cautelosamente para dentro dos meus Sapatos pretos. Procuro a minha pasta preta, Freneticamente. Como se andasse à procura de mim, Mas soubesse desde sempre Que nunca me ia encontrar ali. Mas procurava… Procurava porque sei, Que apesar de não me ver, Eu estou ali: No vazio, no vago, Na falta de uma coisa que realmente é. Aos pés da cama está a pasta preta – 98