Detectives Selvagens 0 - Julho 2014 | Page 27

NÓS DESFEITOS Já não conto a ninguém que oiço o ruído do teu sangue até nas ervas ondulantes, como se a tua carne fosse túmulo em incessante flor. Não visito os espelhos de fumo em que rarefeitos oscilamos ainda entre amar e partir. Ouro cantante na luz aprilina, pés forjados em valsa russa e agora imóveis, é tardia a palavra regresso, e aqui tão fundo o sossego. Tu já não tens de aprender como se morre — os teus dias minuciosamente vivos não têm sobre quem se derramar. Só a tua sombra se inclina em busca de outro corpo que anoiteça e um dia leia para o mundo com a boca ferida os epitáfios que achou dentro da tua. 27