A democracia sob ataque | Page 64

isso suficiente coesão ideológica ; e , em matéria de pensamento e ação política , não vai além do imediato . A direção que têm tomado os sufrágios populares em tantas instâncias mostra isso claramente . Resulta daí que nem o governo e os partidos que o sustentam podem contar com um apoio popular suficiente para levarem a cabo uma tarefa administrativa de largo fôlego ; nem a oposição , por motivos semelhantes , conta com autoridade moral para servir de freio aos erros do governo . E não tem outro recurso , para justificar sua existência , que se agitar freneticamente e sem outra perspectiva que arrastar o país nessa agitação estéril ”. ( Revista Brasiliense , n . 8 , nov . -dez ./ 1956 ).
Com a persistência das velhas práticas da política brasileira – de “ hostilidades pessoais ou de grupo ”, “ de rivalidades de campanário ” e dos debates de questões políticas e administrativas “ no plano de suas preferências doutrinárias e convicções pessoais ” –, Caio Prado divisava um quadro político sombrio , de crescente confusão e vazios que haveriam de alimentar os grandes interesses nacionais e internacionais à espera de “ dias ainda piores de completa desordem e desorganização da vida administrativa do país ”. ( Revista Brasiliense , n . 8 , nov . -dez ./ 1956 ).
Na terceira dessas análises caiopradianas , “ Panorama da política brasileira ”, publicada no final de 1961 , já em andamento o governo Jango , a avaliação do momento era de grande preocupação . O foco era a circunstância de “ desequilíbrio catastrófico ” que se estava criando a partir de uma situação de “ vácuo ” e “ marasmo ”. Ele chega a interpelar as “ forças políticas dominantes sobre que recai a responsabilidade da direção do país ” pela omissão numa hora “ em que mais se fazia sentir a necessidade da ação , de uma tomada decisiva de posições , de perspectivas claras e de realizações de grande envergadura ” ( Revista Brasiliense , n . 38 , nov . - dez ./ 1961 ). Dizia que a política brasileira se encontrava num “ ponto morto ”, na “ completa esterilidade dos seus atuais quadros políticos ”, vivendo-se uma situação que se deteriorava sem uma estrutura político-partidária capaz de dar passagem a formas de “ atividade política fecunda e de perspectivas ”. ( Revista Brasiliense , n . 38 , nov . -dez ./ 1961 ).
Assim ele via a raiz dessas “ incongruências ” e “ inconsequências ” que “ estranhamente ” se perpetuavam : “ Realmente , a política brasileira ainda se acha fundamentalmente disposta dentro de um velho esquema inteiramente superado pelos fatos e , que herdado de um passado que já se vai tornando remoto , vem anacronicamente se arrastando sem renovação . Esse esquema
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