6388ceec48bda078595032pdf

38 | Cidade Nova | Dezembro 2022
Educação | revista @ cidadenova . org . br
Ensino-aprendizagem e gestão escolar

A escola como espaço de formação antirracista

Por José Nilton Júnior
O autor é bacharel em História e em Teologia , é licenciado em Filosofia e mestre em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ ). É professor de História no Ensino Médio , escritor e palestrante . Atua como colaborador na formação antirracista de atletas profissionais e de base , e como consultor ligado à pasta de História e Responsabilidade Social do Clube de Regatas Vasco da Gama , do Rio de Janeiro , além de ser colaborador do Observatório da Discriminação Racial no Futebol .
EM 1966 , a Organização das Nações Unidas ( ONU ) declarou 21 de março como Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial , em memória ao massacre que aconteceu na África do Sul , em 1960 , durante o regime do apartheid , no qual brancos e negros não podiam viver juntos e não tinham as mesmas condições de vida , trabalho e educação . No Brasil , desde 2003 , temos 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra , escolhido por ser a data da morte de Zumbi dos Palmares , grande líder da resistência negra e luta pela liberdade durante o período escravista . Em alguns estados brasileiros , é feriado . Em geral , mais recentemente , temos celebrado todo mês de novembro como um momento oportuno para refletirmos sobre o racismo , suas causas , mazelas e , sobretudo , práticas na luta contra essa triste realidade que assola o nosso país e o mundo .
As escolas também refletem o racismo do Brasil , pois facilmente podemos verificar o recorte racial no número de alunos brancos e pretos concluintes da Educação Básica , com Ensino Médio completo ou , ainda , com Nível Superior . Esse abismo é imenso . Ao mesmo tempo , as escolas também são importantíssimas para transformar essa situação e criar mecanismos concretos e reflexões necessárias para desconstrução dessa realidade , para romper com as barreiras socio- -raciais que persistem ainda hoje em nossa sociedade . Disse Nelson Mandela : “ ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da sua pele , ou por sua origem , ou por sua religião ; para odiar as pessoas precisam aprender , e se elas aprendem a odiar , podem ser ensinadas a amar , pois o amor chega mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto ”.
A sala de aula é um espaço propício para ensinar às futuras gerações a romperem com esse ciclo de hegemonia , ser espaço de diversidade . A educação não pode se isentar desse papel . O racismo precisa ser pauta nos projetos pedagógicos desde a Educação infantil , começando pela valorização da cultura afro-brasileira no espaço educacional , o que inclusive já está contemplado na Lei 10.639 de 2003 .
Uma prática que vem sendo observada , nos últimos anos , é a criação de departamentos especializados , nas escolas e universidades , públicas e privadas , para implementarem-se nesses espaços políticas e ações concretas de combate ao racismo . Esses órgãos também criam um ambiente seguro para que crianças e jovens possam denunciar comportamentos e agressões racistas , além de acompanhar os projetos pedagógicos , a fim de que não sejam excludentes , racistas e disseminadores de qualquer estrutura desse modo . O que importa aqui não é só afirmar que não aceitamos o racismo , mas também trabalhar no combate dele , com formação e ações concretas constantes , pois o racismo se apresenta de muitos modos e maneiras .
Sou educador e tenho realizado alguns encontros de formação sobre racismo em diferentes escolas , com estudantes de diferentes segmentos e com equipes pedagógicas ; e é curioso , apesar de esse assunto ter ganhado um pouco mais de destaque durante a pandemia : ainda há , em geral , um desconhecimento do que seja racismo . Embora reconheçamos que nosso país , infelizmente , é racista , ninguém se identifica como racista . Vivemos em uma estrutura racista , mas não nos sentimos parte dela , como se o racismo fosse sempre um problema do outro . E o racismo é um problema de todos nós .
Outro ponto importante é a busca em ler e conhecer um pouco sobre a rica literatura que está sendo oferecida sobre a vida e a história de pessoas negras , o que podemos chamar de letramento racial , quando individualmente as pessoas buscam esse modelo de conhecimento , de leitura , isso nas mais diversas áreas . É preciso reconhecer a importância dessas pessoas na formação da nossa cultura . Tomar iniciativa e sair da inércia são movimentos necessários quando tratamos de combate ao racismo . A negação , o silêncio , raiva ou até mesmo a culpa são algumas das ações mais comuns quando se diz que uma pessoa foi racista . No entanto , o comportamento mais importante é o reconhecimento desses atos , dessa estrutura e , sobretudo , a disposição pessoal de cada um em ser um antirracista . Como afirmou Angela Davis : “ não basta não ser racista , sejamos antirracistas .”

38 | Cidade Nova | Dezembro 2022