Protagonistas | Luís Henrique Marques | [email protected]
Eles escolheram fazer a diferença
Como se estivesse em casa
SOLIDARIEDADE Iniciativa de fiéis católicos de Caxias do Sul
acolhe moradores em situação de rua durante o rigoroso
inverno da Serra Gaúcha
NATURAL DE VACARIA, no nordeste do Rio
Grande do Sul, Rafael Rodrigues Vieira tem 35
anos e hoje vive nas ruas de Caxias do Sul, na
Serra Gaúcha. Dependente químico desde os 12
anos, Rafael se viu obrigado a sair de casa porque
a convivência com familiares se tornou insus-
tentável. Depois de diversas tentativas malsuce-
didas de reabilitação, em diferentes entidades de
recuperação para dependentes químicos, e va-
gando de um lugar para o outro, Rafael foi parar
em Caxias do Sul. Ali, se não fosse a atitude so-
lidária de um grupo de voluntários de paróquias
católicas da cidade, talvez já tivesse morrido de
frio, dado o rigoroso inverno que costuma atin-
gir essa região do país. “Eu me sinto acolhido,
protegido; o pessoal é ‘gente fina’”, afirma.
Como Rafael Vieira, cerca de outros 50 mo-
radores em situação de rua são atendidos desde
o último 11 de junho pelo Projeto Hospedagem
Solidária, iniciativa de um grupo de leigos cató-
licos ligados às paróquias do centro de Caxias.
“Parte do grupo já realizava trabalho de distri-
buição de sopa, uma vez por semana, pela Pasto-
ral da pessoa em situação de rua”, conta o padre
Leandro Teles, da Paróquia Nossa Senhora de
Lourdes. Porém essa ação parecia insuficiente.
“Então, esse pequeno grupo de leigos pro-
curou o bispo diocesano – Dom Alessandro
Ruffinoni – e os padres das paróquias do cen-
tro da cidade e propuseram ampliar essa ação
para socorrer a população de rua no período de
inverno”, relata o padre Leandro. Assim, com
o apoio do clero e após duas semanas intensas
de reuniões, teve início o projeto de hospeda-
gem das pessoas em situação de rua. “Para a
nossa diocese é uma graça, um sinal forte de
Deus, especialmente porque no Ano do Laicato
tivemos o nascimento de uma ação tão impor-
tante e tão urgente em nossa cidade em termos
28
|
Cidade Nova | Setembro 2018
de demanda pastoral por iniciativa dos leigos,
em função de uma preocupação deles”, declara
Dom Alessandro Ruffinoni.
O PROJETO
Flávio Grasselli, um dos idealizadores da ação,
conta que, inicialmente, o grupo se dedicou a
conseguir voluntários nas sete paróquias da re-
gião central de Caxias do Sul: Catedral de Santa
Teresa D’Ávila, São Leonardo Murialdo, São Pele-
grino, Pio 10, Santa Catarina, Nossa Senhora de
Lourdes e Sagrada Família. “Aproximadamente
200 voluntários aderiram ao projeto, incluindo
pessoas que não participam de atividades pasto-
rais das paróquias. Também representantes de
movimentos eclesiais – Focolares, Renovação
Carismática, Emaús, Cursilhos de Cristandade,
Cenáculo – passaram a fazer parte do projeto”,
conta Grasselli. Depois de uma reunião de trei-
namento, com orientação de assistentes sociais
da Fundação de Assistência Social (FAS) do mu-
nicípio, esses voluntários se dividiram em 40
equipes e, sob a coordenação de educadores so-
ciais pagos pelo projeto, passaram a realizar o
trabalho de acolhida dos moradores de rua, na
sua maioria homens adultos.
A Paróquia de São Leonardo Murialdo cedeu
seu salão de festas para acolher os beneficiários
do projeto, que são atendidos todos os dias da
semana, a partir das 19h30. Recebidos por vo-
luntários, os moradores contam com um breve
momento de espiritualidade e atividade recre-
ativa, tomam banho, jantam, dormem e saem
pela manhã, após o café. A capacidade de aten-
dimento do projeto é de 50 pessoas, mas houve
noites em que esse número foi ultrapassado.
A generosidade não se manifestou apenas
em termos de mão de obra voluntária. O proje-
to conseguiu arrecadar todos os recursos mate-